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  • Foto do escritorProjeto Alumeia

Temos problemas com a História da Arte?


A resposta para a pergunta do título é: Sim, temos.


O ponto central não é a História da Arte em si, e sim quem conta e como a conta essa História.


Não sei se você já teve contato com conteúdos sobre História da Arte, mas vejamos um panorama rápido a da geografia aplicada no ensino dos movimentos artísticos considerados tradicionais e relevantes para nosso cotidiano.


Normalmente nas disciplinas e livros de História da Arte encontramos informações sobre movimentos artísticos que acontecem exclusivamente no continente europeu e nos Estados Unidos. Por um breve momento tratam da Arte Antiga como sendo uma “Arte Pré-Histórica”.


Aqui utilizaremos o termo entre aspas, pois em nossos estudos constatamos que a “Arte Pré-Histórica” abordada nos livros tradicionais trata de um compilado de informações. Falar de “Arte Pré-Histórica” é o mesmo que considerar as produções deste período como precedentes à “história oficial”, descaracterizando importantes fatores históricos como localizações geográficas, culturas e períodos, incluindo diversas obras e movimentos em um único bloco grosseiro nomeado de “Arte Pré-Histórica” ou, ainda pior, “Arte Primitiva”.


O termo “primitivo” significa “rude, que não evoluiu, não se aperfeiçoou; antiquado, arcaico, atrasado”. Bizarro, né? É como se, ao olhar de pesquisadores que utilizam tais termos, as produções originárias não fossem válidas.


A Arte Egípcia, que é comumente abordada após a tal “Arte Pré-Histórica” não é inserida como pertencente ao continente Africano, mas sim como Arte Egípcia apenas. A quem esses pesquisadores querem enganar? Por qual motivo desconsideram todo um movimento e só contam o que lhes interessa?


Em seguida, a Arte na Grécia é abordada de forma extensiva. Há muitos detalhes do que é considerado belo, do que foi desenvolvido na filosofia e inúmeras disciplinas de pensamento durante o período. Uma intensa valorização ao movimento.


Após isso, temos um pulo para a valorização dos movimentos artísticos que desenvolveram-se na Europa, abordando sobre obras de pessoas nos soam familiares, como: Da Vinci, Picasso, Van Gogh, Monet, Dalí, Renoir, Rembrandt, entre outros.


Todos brancos, europeus e homens.


O problema principal, como diz Sally Price em sua tese “A Arte dos Povos Sem História”, é o fato de que historiadores e antropólogos abordam de forma pejorativa qualquer movimento artístico que não tenha relação direta com a Europa, assim como, desvalorizam e demonizam obras que são provenientes de outras regiões do mundo.


Muitos pesquisadores consideram que em outras regiões geográficas a arte não é considerada arte e não deve fazer parte da contação de histórias do mundo, pois esses povos que criaram essas peças artísticas não sabem registrar ou contar suas histórias.


Mas, o mais curioso (e absurdo) é que esses mesmos historiadores/antropólogos que negam a cultura e história de outros grupos que não europeus, além de terem escravizado povos, roubaram peças do continente africano - por exemplo - para construir seus museus grandiosos e seus artistas renomados. Aqui tem um artigo interessante sobre as problemáticas que giram em torno das históricas peças (roubadas) que compõem os acervos de museus europeus.


Um branco, europeu (espanhol), se apropriou de ideias e fez sucesso por isso.

Picasso - por exemplo -, se “inspirou” nessas obras roubadas e ganhou muito reconhecimento por isso. Ele ainda é considerado como um dos maiores artistas da História da Arte.


Bruno Moreschi fez um levantamento em 2015 e 2016 sobre a quantidade de nomes e regiões de nascimento de artistas tratados em livros de História da Arte. Não é surpreendente, pois essa abordagem eurocêntrica é algo que já tem sido questionado no meio da Arte, porém, o levantamento é importante para mensurar o quão problemática é o tratamento do que significa a História da Arte.


“De um total de 2.443 artistas, apenas 215 (8,8%) são mulheres, 22 (0,9%) são negras/negros e 645 (26,3%) são não europeus. Dos 645 não europeus, apenas 246 são não-estadunidenses. 1.566 são pintores.”


Neste link você acessa todo o conteúdo e panfleto produzido com todos os dados da pesquisa. Foram mais ou menos 11 livros de História da Arte analisados no projeto, livros que são trabalhados nos cursos de Arte e Design no Brasil.


“É impossível falar sobre uma única história sem falar sobre poder. Há uma palavra, uma palavra da tribo Igbo, que eu lembro sempre que penso sobre as estruturas de poder do mundo, e a palavra é "nkali". É um substantivo que livremente se traduz: "ser maior do que o outro". Como nossos mundos econômico e político, histórias também são definidas pelo princípio do "nkali". Como é contada, quem as conta, quando e quantas histórias são contadas, tudo realmente depende do poder. Poder é a habilidade de não só contar a história de outra pessoa, mas de fazê-la a história definitiva daquela pessoa. O poeta palestino Mourid Barghouti escreve que se você quer destituir uma pessoa, o jeito mais simples é contar sua história, e começar com "em segundo lugar". Comece uma história com as flechas dos nativos americanos, e não com a chegada dos britânicos, e você tem uma história totalmente diferente. Comece a história com o fracasso do estado africano e não com a criação colonial do estado africano e você tem uma história totalmente diferente”. Chimamanda Adichie: O perigo de uma única história.


Dito tudo isso, é fundamental repensarmos que tipo de histórias estamos contando e aceitando. Precisamos refletir se temos realmente que aceitar, nos conformar e engolir o que sempre nos foi afirmado ou se podemos refazer todos os processos e recontar a História da Arte a partir de outra perspectiva.


Aqui tem uma mesa de debate sobre o tema, mediada por Nathalia Grilo Cipriano no II Colóquio de Pesquisa e Design - De(s)colonizando o Design.



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